por Virgínia Brandão
Sopa é um alimento
líquido ou pastoso, umas vezes feita somente de pão e água, outras com cereais
e, ainda, hortaliças e carne de diversos tipos. Presente na alimentação humana
desde que o homem pré-histórico encontrou um meio de aquecer a água para cozer
alimentos - a sopa foi, provavelmente, a primeira comida elaborada e criativa
da História, já que resulta da mistura de ingredientes e estes são praticamente
infindáveis. Afinal, diz a lenda, que, havendo água, até de pedra se pode fazer
uma sopa.
Com toda a sua simplicidade e rusticidade, a sopa nasceu
quando o homem se deu conta que as carnes duras que caçava se amaciavam e
adquiriam melhor sabor se cozidas com água e ervas. Quando ele bebeu desse
caldo e se agradou dele, a sopa se incorporou à civilização para nunca mais
sair. Recipientes de todas as espécies, do estômago de animais à sopeiras de
ouro, testemunharam ao longo dos tempos o hábito ininterrupto, de todos os povos,
de preparar e tomar sopas. Por ser um prato fácil e acessível, de considerável
valor nutritivo e energético, os caldos e as sopas foram a base da nutrição de,
praticamente, todas as civilizações.
A Bíblia nos conta que os hebreus, no Egito, preparavam
suculentos caldos e, referindo-se a Gedeon, nos diz; "matou um cordeiro,
pôs sua carne em uma panela e fez caldo". Na Grécia, a sopa fazia sucesso.
Em Atenas, a de lentilhas, em Esparta, o famoso "Caldo Negro" feito com sangue de alguns animais misturado
com vinagre e especiarias (parece estranho, alguns autores dizem que era
intragável, mas o frango ao molho pardo, aquele das Minas Gerais, também tem
essa base). Na China, os camponeses se reconfortavam com sopas de arroz e
favas. Roma teve uma grande tradição "sopeira". Desde os seus
primórdios os pastores tinham como prato principal e cotidiano uma sopa de
farro (um grão típico da Itália, muito antigo, semelhante ao trigo mas de
consistência mais dura) e grão de bico, que se acompanhava com outros produtos
de época como verduras, legumes, frutas e queijos. A decadência de Roma
coincide com o auge das sopas, que chegou a transformar-se num alimento de
luxo.
Após a queda do Império Romano, a sopa sobreviveu ao Império
Bizantino, cujo povo se regalava com sopas de peixes com legumes, muito
nutritivas e açucaradas com mel em abundância.
Apogeu na Idade Média
No século 12, sopa designa um pedaço de pão sobre o qual se
verte caldo fervente de carnes, legumes ou vinho, diretamente em travessas
fundas de madeira, barro cozido ou estanho. Uma crônica da época, conta que os
priores e abades foram os primeiros adeptos da iguaria, fazendo servir de 5 a 6
sopas distintas diariamente, além de ser o tema um assunto de animadas
conversas e discussões
Durante a Idade Média, as sopas, de fato, ganham
notoriedade, não só nas abadias e mosteiros. A medicina reconhece suas virtudes
terapêuticas e passa a prescrevê-la como remédio, sendo o caldo de galinha o
mais cotado, antes de qualquer outra.
Na mesa do pobre, ela era, de longe, o alimento complementar
mais importante. De ovos, favas, abóbora, alcachofra, alho-porro, ervilha,
couve, rabanete e outras hortaliças, em geral selvagens, era ela que, de manhã
e de noite, ajudava a engolir o pão duro e escuro dos camponeses, este, o
principal elemento da alimentação popular. O caldo dessa sopa era, quase
sempre, temperado com cebolas e dentes de alho e aromatizado com diversas ervas; sempre que possível, um pdaço
de carne, em geral de porco, salgado, temperado com gordura, manteiga ou óleo.
Foi, ainda, a essa altura, que as sopas começaram a aparecer
no repertório culinário da nobreza européia, mas, diferentemente da sopa dos
pobres, os caldos eram fartos em carnes e condimentados com muitas especiarias.
Eram comuns as sopas agridoces, nas quais usava-se mel e, mais tarde, açúcar.
Também era costume colorir as sopas: açafrão para ficarem amarelas, leite de
amêndoas para ficarem brancas.
Tempos Modernos
De arquétipo das virtudes campesinas e posterior emblema da
calma felicidade burguesa, a sopa adentra a era moderna sofisticando-se. A partir do século 16, as cozinhas italiana e
francesa deram o seu "toque de classe" à arte de prepará-las. A
primeira introduziu a novidade das massas e ervas aromáticas como o tomilho, os
orégãos e a manjerona. Na França, os cozinheiros davam o seu melhor: crèmes,
bouillons, veloutés, consommés..., batizando as suas invenções com nomes de
reis.
No século 17, Louis 13, rei da França, saboreava,
diariamente, dois grandes pratos de sopa. Entusiasmado com os legumes, mandou
que se plantassem no Palácio de Versailles os mais delicados e deliciosos legumes
e estes passaram a entrar nas inúmeras
"potage de plaisirs" (sopa de prazeres) que se tornaram a última moda
entre a aristocracia francesa. Isto estimulou os cozinheiros da época, entre
eles, Françoise de la Varenne (1615-1678), que, sozinho, criou mais de 300
receitas diferentes.
Nas mãos dos mais célebres chefs franceses, as receitas
reais se enriquecem e, no século 19, por toda a Europa, as sopas passam a abrir
o menu dos jantares das boas mesas. Uma mesma refeição pode comportar de duas a
cinco sopas diferentes: "A la Conti, A la Saint-Cloud, A la Dauphine, A la
Pluche…". Nesta época, o grande chef de cozinha Antoine Carême, atualizou
as velhas fórmulas e legou à posteridade as bases das receitas que ainda hoje
se servem nos restaurantes mais afamados do mundo inteiro.
Mais sofisticadas, com consistência mais leve, as sopas
servidas como entrada têm por papel abrir o apetite a fim de fazer honra à
abundância das refeições onde se sucedem, às vezes, mais de dez pratos.
Paralelamente, a sopa guarda seu status de prato único e substancioso junto às
famílias pobres, sobretudo dos camponeses.
A Sopa Tecnológica
O século 20 assistirá à evolução dos modos de alimentação,
inseparáveis das transformações dos modos de vida humanos, mas a sopa continuou
tendo relevante papel na dieta universal. Com a tecnologia, vieram as sopas
prontas, em lata, desidratadas, congeladas, dos mais variados sabores, pra
todos os gostos e bolsos. Algumas são realmente muito gostosas e, todas,
inegavelmente práticas. Entretanto, numa noite de frio, quem resiste a uma
sopinha caseira, feita com ingredientes naturais fresquinhos, impregnando a
casa com seu perfume e fumegando na sopeira?
Sopas mais famosas do
mundo
Alguns pratos são
como o cartão de visita de um povo, porque fazem parte da sua cultura
gastronômica e da sua História. Isso acontece de uma maneira muito especial com
as sopas, que, em boa parte do mundo, são, tradicionalmente, o primeiro prato
da refeição principal do dia. Veja algumas delas:
- Do Brasil: Bambá de Couve (farinha de milho e couve), Caldo
de Mocotó, Caldo de Feijão;
- De Portugal: a Canja (que, segundo alguns especialistas,
terá vindo da Índia) e o Caldo Verde;
- Da Espanha: o Gazpacho (com tomate, pepino, alho, pão e
azeite, servida fria).
- Da França: a Soupe à l'Oignon (a base de cebola) e a
Bouillabaisse (a base de legumes com frutos do mar frescos), Bisque (cremosa, a
base de frutos do mar);
- Da Inglaterra: a Oxtail (sopa de rabo de boi);
- Da Itália: o Minestrone (com feijão, massas e
legumes,comumente feita com lingüiça);
- Da China: a Sopa de
Ninhos de Andorinha, Won Ton (caldo com bolinhos recheados de hortaliças e
carne);
- Do Japão: Missoshiro (caldo de peixe com missô)
- Do Vietnã: Canh Chua (caldo aromatizado com hortelã e tamarindo
com pedaços de peixe);
- Da Tailândia: Tom Kha Gai (de leite de coco com frango,
muito coentro e outros aromas);.
- Da Rússia: o Bortsch (de beterraba frescas, servida quente
ou fria);
- Do México: Posole (com carne de porco ou frango, caldo e
canjica);
- Dos Estados Unidos: Vichyssoise (de batata e alho porro,
servida fria); Clam Chowder (creme encorpado, quase em mingau a base de
moluscos, batatas e leite)
- De Cuba: Sopa de Frijoles com Calabaza, (de feijões com
abóbora);
- Do Haiti: Consommé a l'Orange (de caldo de frango, suco de
laranja e cravo da índia)
- Do Egito: Melokhia (a base de uma erva egípcia que dá nome à
sopa e carne de cordeiro ou frango);
- De Israel: Pumpkin
Soup (de abóbora e caldo de frango).
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